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INQUIETO

"Falo o que sinto e sinto muito o que falo - pois morro sempre que calo." (Affonso Romano de Sant'Anna_Que País é Este?)

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2021

O rei da barriga

 Quebrei muitas coisas

outras tantas, as consertei

Por ser homem de palavras

abri e fechei as travas

corrompi a lei


Deixei pessoas aos prantos

outras tantas, as que amei

Por ter o fulgor, faltava

e quase me arrebentava

nas entranhas, o meu rei


Tenho, em mim, todas as chagas

as que existem e as que inventei

Por mais que buscasse

não me curava

de todos males, os acessei


Voltam a sangrar, as feridas

após anos de escondidas

destrançam-se, as cicatrizes

ampliam a imensidão do tempo

e deixam, em carne viva, o corpo

quarta-feira, 20 de janeiro de 2021

Terreirão

 Não aceita a idade

o rio corrido

as correntes margeiam

os troncos cortados

Não aceita suas rugas

a velhice dada

o caminho traçado

e o percorrido

Não se mete na blusa

com que pulava muros,

roubava frutas

e rezava

Não corre seus passos

e o prazo o engole

acelera o tempo

e reduz o espaço

segunda-feira, 18 de janeiro de 2021

Ca La Nuri

 Do caos

à paz

Da turba

ao isolamento

Dá hora

ao tempo

De mim

para ti

todo o meu vento

sábado, 9 de janeiro de 2021

Tijolo

 


A vida é uma reticência e ponto

Cheia de final sem recomeço

Plena de começos sem fim


A vida são vidas feitas

Sólidas ou rarefeitas

Não permanecem ou passam


Em cada trampolim

Pulamos 

Sem saber o pranto


Temos todos fatos

Em nossa fuça

Mas não há recusa


O que sabemos

Tão pouco vemos

Nos direciona


E nesse fim

Há destino

Ou novo fio



TiTolo

 



Jogo-lhe tijolo

na testa

Por uma finestra


Por todo seu caminho

Tem um carimbo no seio

Bem no meio


O que lhe faz assim

Sendo você, sem mim

São as veias


Um movimento

Carrega seu trilho

Sem desancar


Na correria

Perde seu Lar

E as paredes


Meu tijolo,

Agressão que seria

Constrói!


O seu rumo dói

Destrói

E desfaz

quarta-feira, 30 de dezembro de 2020

O nome da palavra



Só o tempo sabe o quanto estamos passados

Nem o vento 

Nem a chuva

Têm a mais puta ideia do quanto vivemos


A palavra proferida aos ares

Contém mais que seus significados

Carregam a vida

Vivida e renunciada


Nossas rugas e cicatrizes dizem tanto

Dos caminhos

Dos atalhos

Procurados na ânsia de nos encontrarmos


Uma frase tem espaços entre as letras

As lacunas do intentado

Onde moram pretensões

Por aventura aos nossos lados


Não há um só código

Não há um só dado

Há mais entre o silêncio e a fala

Que pensa nosso antepassado

domingo, 20 de dezembro de 2020

Lar de

 Já não tenho casa

Ou nunca tive conforto

Não pertenço a lugares

Mas a sentimentos

Que mudam a cada instante

Portanto moro em apartamentos

Em condomínio de emoções

Das minhas próprias emoções

Cheio de elevadores e escadas

Esse edifício pega fogo a todo instante

Há sempre um incêndio

E preciso correr de mim mesmo

Pra lugar algum

A única saída plausível

É a janela

Mas que acaba me fazendo ver

Ter mais belezas aqui dentro

Que suposto nos olhos alheios

Portanto fico

E queimo

O fogo arde e cura

Se desaba um andar da minha brasa

Já tenho um novo lar para viver

terça-feira, 15 de dezembro de 2020

O Pentelho Elétrico

 Ei fio, liga na tomada

Acende o pavio na tensão

Chamusca maçarico no cabelo

e vamo incendiar toda nação


Tem toda energia neste solo

Carregada desejosa e sem razão

Então pulemos juntos nesta dança

não importa qual coloração


A corda foi cortada p/ confete

Algemas vão virar celebração

pois se abrirem, é comício ou zoação


Tire a sua blusa e se junte

aqui o que não falta é divisa

à desmaiar metade e a outra pisa.

segunda-feira, 2 de novembro de 2020

Carta ou Convite

 Tenho palavras tortas atrás da porta

Eu bato

Caso tu não te importas

Abra

Cadabra

Uma palavra é agulha com linha enfiada

Me tece um fio 

E enrascadas

Sê o penhasco de que me lanço

Com amor ou ranço

O que mais se pode querer

É conhecimento

Atado à tesura

Não me penitencia

Pelo desespero

ou silêncio

São resumos do descontentamento

Expressão do tempo

Penso que tanto movimento

Cause ranhuras

Umas fresas na sua postura

Ou espanto

Estamos na praça

Tem tanto vento

Tão pouco banco

Procuro um assento

E ao te ver 

Quero tanto uma prosa

Quase uma briga

Uma rinha

Do meu jeito maluco

Imprudente

De fazer desencanto

Eu percebo

Que percebes

Ja não temos traquejo

Temos ataques

Travamos a luta

E neste tamanho

Brinda comigo

Num amargo

Cálice de cicuta 


sábado, 17 de outubro de 2020

Afogar-se sem medo

Vamos tentar ser felizes enquanto estamos vivos
Porque a tristeza é uma garantia
E não vai mudar se não se fizer nada a todo momento
 
Com as drogas que se puder pra alterar o ânimo
Com o dinheiro que se puder colocar fogo para se alterar o ambiente
E o esquecimento do que uma mente já prejudicada possa se beneficiar
 
Os rios continuarão passando contra se não se deixar levar
E ao navegar a favor
Engrossa a correnteza
Do que garante ao mundo
O permanente estado de tristeza
E tensão contrária por alguma felicidade
 
Abrir uma cerveja no café
Acender um cigarro no fogão
E mergulhar em águas turbulentas
Afogar-se
 
Pra vc digo
Penso em estar presente
Decidindo que o Rio Mondego precisa de mim
E o Tejo pode me aguentar

sábado, 10 de outubro de 2020

Rabisco

 Não quero lápis,

nem borracha,

posto o que escrevo

tem tanto relevo

quanto o tempo.

Não apago meus erros

por serem lampejos

de novas constelações.

Há um outro Universo

a cada caminho tomado ao avesso

pelo tamanho do seu interesse

Por que às vezes,

quando não se quer nada,

é que se consegue algo!

sábado, 1 de fevereiro de 2020

AntiCoagulante


É no traquejo dos tempos corridos
onde perdemos sentido,
nas esquinas.
Em um lampejo, temos destino.
Como quem tapa ferida,
acende um cigarro,
para descansar o lume,
de forma ardente,
em pele árida.
Nesse pranto, quando se tem prazer
na dor,
passa obscuro, o profundo significado
das mazelas.
Nesse ponto, o ímpeto da vida
é só destruição.
É no calor dos quartos ressecados pelo outono
onde se escondem os mais apurados pensamentos,
onde não há divergência entre as vontades,
nem se pode encontrar esperança.
É no fulgor do desespero interiorano
onde encontramos resposta
para o quê não se tem pergunta.
Tudo se pode ter
quando nada se quer.
Tudo pode
o ser
que não lhe souber.